João Varejão é um verdadeiro “apaixonado pelo andebol” e uma figura central no desenvolvimento do desporto em Celorico de Basto. Fundador e presidente do BECA, é professor em Celorico de Basto há mais de 16 anos, apresentando um percurso rico como praticante, treinador e árbitro, tendo ainda levado a Seleção Nacional sub-17 ao bronze no Festival Olímpico da Juventude em 2022, com a participação de um ex-atleta do BECA, Afonso Novais.
Presidente da Associação de Treinadores de Andebol, membro do corpo técnico das seleções jovens e docente convidado na UTAD, é também um entusiasta de liderança e gestão de grupos, cultivando um gosto por conhecer pessoas, pela leitura e viagens. Considera-se “apaixonado pela vida, positivo e lutador”.
Atualmente, o BECA conta com mais de 250 atletas e 15 equipas, tendo impactado mais de 600 jovens desde 2012. O clube tem uma equipa de 14 treinadores, professores e estagiários que vão mantendo vivo o andebol no concelho. Nesta entrevista, João Varejão reflete sobre a sua trajetória, desafios e conquistas no BECA, partilhando ainda a visão que o motiva a lutar por um futuro mais promissor para o andebol em Portugal.
Como nasceu a ideia de fundar o BECA? Qual foi a motivação?
A criação do BECA resultou da vontade de ensinar uma modalidade que sempre foi uma paixão para mim. Nesse sentido, solicitei ao Agrupamento de Escolas a possibilidade de criar, no ambiente escolar, um clube de andebol, à semelhança de um clube de teatro ou de inglês. Assim, iniciei os treinos para um grupo de alunos, na altura no 5.º ano, que não conheciam o andebol, mas que se superaram na sua prática. A minha motivação advém da paixão que tenho pelo andebol, alimentada pela felicidade que vejo diariamente nos atletas, pelos desafios que me colocam e pelos resultados finais, que têm culminado em sucesso académico e desportivo, assente nos verdadeiros valores que a sociedade atual tanto necessita.
Que principais desafios enfrentam no dia a dia do clube?
O maior desafio, atualmente, é combater o excesso de utilização das novas tecnologias e, por consequência, o sedentarismo entre os mais jovens, que podem vir a tornar-se adultos obesos. Além disso, é a necessidade de encontrar um equilíbrio entre formar atletas de forma sustentável e com qualidade, mas também alunos que valorizem os estudos, sejam ambiciosos e curiosos.
Os apoios, públicos e privados, são suficientes?
A nossa sustentabilidade financeira resulta da delegação de competências do Município no BECA, com o objetivo de promover e desenvolver o andebol em Celorico de Basto, bem como do apoio de mecenas e empresas que reconhecem o nosso trabalho e se associam ao nosso sucesso. Atualmente, enfrentamos a necessidade de mais pavilhões desportivos cobertos, para aumentar o número de treinos dos atletas, bem como de recursos humanos qualificados, para dar resposta aos mais de 250 praticantes desta modalidade, de ambos os sexos.
Como tem sido a evolução do BECA ao longo dos anos?
O nosso projeto está geneticamente conectado com a escola. Somos um clube inserido num Agrupamento com centenas de alunos, professores, auxiliares e toda a comunidade educativa. Todos os anos vemos os nossos alunos partirem, no final do 12.º ano, rumo a novos desafios e projetos. Por isso, diria que o nosso maior desafio é superado quando vemos que estes alunos, e também nossos atletas, conseguem atingir os objetivos que perseguem. Nesta linha de raciocínio, destacamos que, desde 2012, conseguimos formar 10 atletas internacionais que representaram a Seleção Nacional, um registo significativo e relevante da nossa evolução. Atualmente, não conseguimos abarcar mais atletas do que os que já praticam, porque necessitamos de mais recursos humanos e infraestruturas desportivas. A nossa linha de evolução tem sido uma referência na formação desportiva em Portugal.
Que impacto tem a atividade desportiva no rendimento escolar dos jovens?
Podemos afirmar que o andebol tem contribuído para o sucesso académico dos nossos atletas a par do sucesso desportivo. Este ano, todos os atletas do BECA que estavam no 12.º ano entraram na faculdade. Os pais ficaram felizes, mas mais felizes devem estar os jovens, pela resiliência e capacidade de superação que demonstraram ao longo destes anos de trabalho e prazer. De uma forma geral, a prática do andebol tem o potencial de melhorar o rendimento escolar dos jovens, especialmente quando se adota um equilíbrio saudável entre as duas áreas. Paralelamente, os benefícios cognitivos, emocionais e sociais da prática do andebol contribuem para o seu desenvolvimento integral. Não obstante a esta constatação, é fundamental que os atletas treinadores, professores, pais e escolas estejam atentos ao equilíbrio entre o desporto, neste caso o andebol, e os estudos, para evitar uma sobrecarga, garantindo que ambos os aspetos do desenvolvimento sejam devidamente assegurados.
Quais são os valores que o BECA pretende transmitir aos seus atletas?
O BECA procura alinhar-se com os valores promovidos pelo Agrupamento de Escolas, mas destacaria a promoção da excelência, da amizade, do respeito, da solidariedade, da equidade, da educação, da paz, do fair-play, da diversidade, da saúde e da autodisciplina. Os nossos valores vão muito além dos resultados desportivos, com um foco claro no desenvolvimento integral do ser humano e na promoção de um mundo mais justo, pacífico e unido pelo desporto.
Como presidente do BECA e selecionador nacional de andebol sub-17 e sub-19, que estratégias utiliza para identificar e promover o talento jovem?
Essa é uma questão pertinente, frequentemente colocada em contextos de formação e seminários com treinadores de diferentes modalidades. No caso do andebol, um dos primeiros indicadores é a estatura. Quando vemos jovens altos e fortes, surge a curiosidade de saber se os pais também são altos e se estamos diante de um potencial talento. Depois, naturalmente, procuramos jovens dotados fisicamente, no que concerne a capacidades coordenativas e condicionais, e que tenham aptidão para jogar andebol. O tempo, a qualidade do treino e da competição, a dedicação, a resiliência e a capacidade de superação fazem o resto, ao longo de uma etapa longa de desenvolvimento que dura, no mínimo, 10 anos. Na escola, encontramos muitos jovens que praticam várias modalidades e, no nosso caso, tentamos orientá-los para os desportos mais adequados às suas características.
Quais foram os momentos mais marcantes do seu percurso no BECA? Pela positiva e pela negativa?
Os momentos mais marcantes são, sem dúvida, os sucessos individuais dos nossos atletas, que lhes permitem ser convocados para as seleções nacionais ou convidados para integrar os plantéis das melhores equipas de Portugal. Poder treinar atletas deste calibre e constatar a sua evolução e crescimento é admirável e revigorante. Ficamos mesmo felizes pelo sucesso deles. Por outro lado, de forma negativa, não gosto de ver atletas do BECA a desistirem da modalidade. Após a pandemia, enfrentámos algumas desistências, o que foi, sem dúvida, frustrante, sobretudo por não conseguirmos inverter essas decisões. Optaram pela solução mais fácil, que nem sempre é a que mais impacta o futuro social, desportivo e profissional de cada um. Felizmente, são poucos os casos, mas vejo esses comportamentos como negativos.
Qual é o feedback que têm recebido por parte da comunidade de Celorico de Basto?
Em sintonia com os valores que promovemos, somos carinhosamente respeitados pela comunidade de Celorico de Basto, que reconhece o nosso trabalho e missão de promover a igualdade de oportunidades no acesso à prática desportiva de excelência e, deste modo, melhorar também a qualidade de vida de todos os celoricenses.
Como equilibra o tempo entre as responsabilidades do BECA e outras áreas da sua vida?
Às vezes, nem eu sei (sorri). Mas encontro na minha família um aconchego gigante que me fortalece, renova e motiva, traduzindo-se num foco muito sério, responsável e dedicado da minha parte em tudo o que faço.
Que metas ou objetivos gostaria de ver concretizados nos próximos anos? Quais são as expectativas para o futuro do BECA?
Em primeiro lugar, queremos que o andebol em Celorico continue a ser uma referência de excelência para todo o país e que Portugal reconheça Celorico de Basto também pelo trabalho de qualidade que faz pelo andebol. Em segundo lugar, queremos aumentar o número de atletas e equipas em competição, alargando a prática a faixas etárias mais jovens para iniciação, a adultos e até mesmo ao andebol em cadeira de rodas. Por último, a criação de uma academia com melhores condições que permita acolher estágios e competições de relevo nas várias vertentes, tanto masculinas como femininas. Esse é um sonho que ainda não vi concretizado, mas temos dado pequenos passos nesse sentido. Acredito profundamente que o futuro do desporto português passa por projetos como o nosso. Acrescentar uma academia ao que já fazemos seria um passo gigante no desenvolvimento desportivo e uma alavanca para o desenvolvimento económico e social da comunidade celoricense.